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Escolas Indígenas, espaço para desenvolver a cultura

Por Natan Torzeschi

Escola Indígena Marechal Cândido Rondon, em São Valério do Sul. Foto: Natan Torzeschi

Saindo de Independência, foram percorridos 50 quilômetros em estrada de chão para chegar até a Terra Indígena Inhacorá, localizada no município de São Valério do Sul. O trajeto só possui asfalto na RS-571, entre as cidades de Inhacorá e Chiapetta, cerca de onze quilômetros e meio. Apesar da terra indígena ficar em São Valério do Sul, foi mais fácil chegar pela cidade de Chiapetta.

Após mais de uma hora de viagem no veloz 1.0, cheguei até a Terra Inhacorá. Lá, conversei com o Cacique Adilson Policena, para conhecer a Escola Estadual Indígena de Ensino Fundamental Marechal Cândido Rondon que atualmente conta com 430 estudantes matriculados do 1º ao 9º ano.

 

As metodologias de estudos direcionadas à educação indígena nesta escola funcionam da seguinte forma: até o 4º ano é estudado o idioma Kaingang, somente com professores indígenas (são nove atualmente). Adilson, que é vice-diretor da esocla, acredita ser muito importante as crianças aprenderem a sua língua de origem, pois ela os representa e é necessário cultivar a cultura indígena. A partir do 5º ano começam as aulas com professores não indígenas (seis nessa escola), além de iniciarem os estudos de português.

 

A escola, que iniciou as atividades em 1972, desenvolve, além das práticas pedagógicas da educação curricular, várias atividades que caracterizam o povo. As turmas saem a campo, estudam as disciplinas junto à natureza, em uma proximidade maior do conhecimento de sala de aula com suas realidades. O artesanato também é desenvolvido na escola. Outras atividades interessantes são as palestras com o Kuiã, o curandeiro da aldeia, em que são repassados seus ensinamentos para as crianças. E também há os conhecimentos das ervas medicinais que são estudadas na escola.

Uma das principais dificuldades das atividades em escolas indígenas é o calendário. Adilson contou que o calendário kaingang tradicionalmente deveria começar em agosto e terminar em maio, enquanto as aulas na escola precisam ser de fevereiro a dezembro. O costume indígena diz que as crianças precisam ficar em casa com a família durante os meses mais frios (junho e julho), porém isso acaba sendo prejudicado, pois o calendário da rede estadual está configurado para concluir as atividades ao fim do ano. Outra dificuldade está na merenda escolar e no transporte escolar, que não aconteceria entre os meses de dezembro e janeiro, por exemplo.

 

Adilson participa de um núcleo de educação do Estado, que conta com professores indígenas do Rio Grande do Sul que debatem as adaptações para a educação direcionada às suas comunidades. Existe a vontade dos professores em adaptar o calendário para melhor desenvolver suas metodologias, mas que é um desejo difícil de ser alcançado.

 

Outra demanda da Escola Marechal Cândido Rodon é ampliação do espaço físico. O vice-diretor acredita que seria necessário, pelo menos, mais duas salas de aula para atender melhor aos estudantes. Essas configurações que são realizadas pelos professores são formas de manter a cultura indígena viva na comunidade.

 

Além dessa escola, Inhacorá conta com o Instituto Estadual de Educação Indígena Ângelo Manhká Miguel. O instituto de ensino médio está em atividade desde 2014 e recebe Kaingangs de todo o estado. A instituição também conta com formação de professores indígenas em magistério bilíngue Kaingang e EJA. Nosso Estado conta com 90 escolas de educação indígena.

 

No Brasil, 83,58% dos indígenas acima de 10 anos falam português, segundo o censo do IBGE (2010). Embora a grande maioria dos indígenas brasileiros sejam alfabetizados em português, somente 449.4345 indígenas acima de 5 anos falam a sua língua de origem, o que corresponde a 60%. O cacique Adilson Policena vê que os indígenas precisam conhecer as suas línguas para preservarem sua cultura.

 

Para os indígenas não há a educação infantil. A convivência das crianças mais novas com a família é vista como fundamental, pois a família possui muito valor. Apesar disso, há também escolas com ensino infantil, o que não é o caso da Marechal Cândido Rondon.

 

A educação indígena é um direito garantido pela Constituição Federal, por meio de leis que propiciam a qualificação de professores bilíngue, como os da Escola Marechal Rondon. Para tanto, existe o PROLIND, um programa de apoio à formação superior de professores que atuam em escolas indígenas de educação básica e o Programa Bolsa Permanência, que visa ao acesso à graduação de indígenas e quilombolas que se encontram em vulnerabilidade socioeconômica.

Outro avanço importante na educação escolar indígena foi o decreto nº 6861 de 2009. O decreto regulamenta a educação indígena, garantindo, por exemplo, que as comunidades indígenas tenham apoio à construção de escolas, acesso a materiais didáticos específicos e diferenciados e que a comunidade possa participar da organização de suas próprias diretrizes curriculares, respeitando suas necessidades e especificidades.

 

Após conhecer aquela comunidade, me despedi de Adilson com a sensação de que naquela comunidade as práticas e a universalização do ensino, ideal do Plano Nacional de Educação (PNE), vêm sendo lapidadas, de acordo com as realidades de cada comunidade brasileira.

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